“Em 2013 logo escrevo sobre isto outra vez.” Raramente cito frases
redigidas em textos anteriores, mas desta vez tornou-se demasiado irresistível
para não o fazer, como um guloso solitário tentado por uma fatia de bolo
isolada numa mesa redonda. Ultrapassou-se o dia 21/12/2012. Há uns meses atrás,
escrever isto soaria heroico, num conto dantesco de destruição planetária e intergaláctica.
De qualquer modo, penso que o balanço de toda esta situação foi bastante
positivo. Nada aconteceu e tanto aconteceu.
A sociedade necessita ciclicamente de algo a que se agarrar, de um
pretexto ou um propósito para agir desmesuradamente e sem complexos. Criou-se
um evento de verosimilhança discutível, com n
teorias a envolvê-lo, sem que nenhuma fosse aprovada fosse por quem fosse.
Estariam reunidas as condições para um fracasso, mas felizmente os desejos
foram cumpridos. Construíram-se bunkers,
rasgaram-se contratos de trabalho, desperdiçaram-se vidas por uma ponte abaixo
com medo do que pudesse acontecer, aumentou-se a taxa de natalidade com medo do
que pudesse acontecer, escreveram-se bestsellers.
Agora, podem vender-se t-shirts a
dizer “eu sobrevivi ao 21/12/2012” e criam-se páginas de Facebook a prever o próximo fim do mundo. A produtividade, aliada à
criatividade e à falta de bom senso levaram um acontecimento inóspito a uma
dose de loucura mundial que roça o ridículo.
Há quem fale já em 2018 e em 2022, como antes se falava de 2000. O ser
humano procura sempre rejuvenescer a sua dose de fé em factos não
necessariamente justificados. O importante é eles existirem. Porque se não
houver o fim do mundo para combater, podemos arranjar o fim das compotas de
tomate da Dona Alzira, ou a queda da Torre Eiffel em 2015. E pronto, já tenho
uma ocupação e redes sociais para exponenciar até essa altura. E que tal
focarmo-nos no que realmente interessa e concretizar os nossos objectivos, em
vez de alimentar os capitalistas que lucram com estas ideias ridículas?