quinta-feira, 26 de maio de 2011

[49] Enigma

Enigma! Algo desenhado para ser decifrado por outrem. Adoro enigmas. Fazem a mente trabalhar no sentido mais puro e mais construtivo do raciocínio. A psicanálise, o estudo do inconsciente. Até onde seremos obrigados a escavar até ao nosso inconsciente para resolvermos um enigma? Até onde ligaremos o complicómetro, quando podemos ter a resposta à frente da nossa cara? O desafio de um bom enigma passa pelo total alheamento relativo à complexidade imputada na sua construção. É essa curiosidade que dispara os nossos neurónios para umas boas horas de divertimento ou de total frustração.

Paradoxo! Divertimento ou frustração? Realidade ou fantasia? Acordar ou adormecer? Amor ou ódio? E que dois, estes. Aqui entra o discurso das “linhas ténues”. Com que razão podemos nós definir espaçamentos tão distintos entre conceitos? Da fantasia à realidade, muita água passa. Do amor ao ódio, uma gota de uma torneira mal fechada pelo senhor que não lavou as mãos como devia. Ou seja, temos aqui um paradoxo especial. Diferente de todos os outros. Porquê? Porque é mesmo assim.

Irracional! “Porque é mesmo assim?” Calminha. Clara ausência de explicação empírica e formatada, efectuada por via de relatório entregue a um superior. Ok. Não tanto. A racionalidade não implica entrega de relatórios, mas implica uma sequência lógica de pensamentos com deferimentos conclusivos e claros. Quem lê tal coisa, assume agora que a irracionalidade é um monstro peganhento e assustador. Não. A irracionalidade de muitos já fez mover muita água na melhor direcção. Irracionalidade como irreverência. Irreverência essa que explode dentro de mim neste momento, tentando decifrar o meu enigma.

O amor. Muitos já o definiram à sua maneira. Eu vou assumi-lo como um enigma eterno. O amor é o enigma que suplantará tudo e todos pelo carácter paradoxal da sua própria irracionalidade.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

[48] Palmilho

Inspiro fundo. Reconheço um ar que não é meu. Absorto. Compenetrado, viso a linha do horizonte como se o fim do mundo se tratasse. A brisa marítima que engole as minhas órbitas é fresca e seca como uma ventoinha enferrujada. Palmilho um caminho que não é meu. Porém, não deixa de ser uma pegada com o meu ADN. Rodopio de braços abertos como um patriota desconsolado. Grupos de pessoas cruzam o olhar comigo, desconfiadas. Falando com os meus botões, mando-os dar uma volta e, como não o fazem, dou-a eu. Devoro quilómetros como traças num roupeiro bem frequentado. A velocidade com que ando faz-me questionar se duas pessoas estão a empurrar-me pelas costas. Paro. Olho para trás. Apenas eu. Quem mais? Que estupidez. É apenas ela.

Suado e com o meu casaco pendurado no meu dedo anelar, atraco num banco quezilento circundado de margaridas, que não é meu. Descanso por uns segundos, antes de massacrar o meu interior com mais umas centenas de passos. Limpo o suor com a parte de trás da minha mão esquerda. Gotas de consolo. De inconformismo. De coragem. De agradável devaneio. O sol encandeia. Apressa-se por desaparecer por baixo daquele palito inflamável, que tanta água tem. Desafia-me a acompanhá-lo. Não quero. Algo me faz estar ali. É apenas ela.

Deitando-me numa cama de um quarto que não é o meu, já com o candeeiro aceso, duvido que a este se possa chamar o “descanso do guerreiro”. Não estou numa batalha. Estou numa encruzilhada comigo mesmo, onde não há como voltar atrás. Nunca há. Limpo as poucas lágrimas que caem com a parte de trás da mão direita. Gotas de saudade. De felicidade. De carpe diem. Aperto as mãos, uma contra a outra, unindo o suor com as lágrimas que me escorreram pela face. Alguém separou as minhas mãos e pediu um abraço. Assustado, olho para o lado. Mas não há razão para tal. É apenas ela.