domingo, 3 de janeiro de 2010

[13] Escombro

A intempestuosidade do silêncio que zumbe nos meus ouvidos importuna-me como a prepotência inata dos que sabem que são mais fortes. Nesta sala escura, pequenos raios de luz projectam-se no solo de madeira podre impregnada de óleo e tinta seca lascada. As minhas mãos estão desidratadas e impelem movimentos curtos e firmes contra o ar rarefeito, num bombeamento cada vez mais intenso. Com os meus olhos cansados e negros, fechá-los significa o paraíso e abri-los significa o inferno em que estou. Então porque os mantenho abertos? Pensar na resposta faz com que as poucas restantes partes da minha cabeça que não latejavam até agora, tenham oportunidade de o fazer. Psicologicamente, fisicamente, emocionalmente e espiritualmente reduzido à insignificância do ser humano inserido num sistema controlador e escravizador, olho em meu redor e só consigo vislumbrar os tais raios de luz. Onde ando eu, que não me lembro de nada?

Vesgo como estou, nem me apercebi da tábua de madeira interrompida esporadicamente pelos malditos pedaços de luz natural. Deixando-me cair da cadeira onde estou, atinjo o chão com violência enquanto uma picada forte me percorre desde o cotovelo até ao dedo mindinho. Rebolando dentro dos possíveis, finalmente tenho a possibilidade de atingir a tábua, onde uma citação está inscrita a preto, como se queimada. Semi-cerrando os olhos, faço um esforço enorme enquanto controlo os meus impulsos em gastar as minhas últimas forças tentando sair ileso das cordas que me prendem. As tonturas tornam esta sala uma máquina de lavar a centrifugar. Não consigo mais. A minha cabeça embate no chão e uma dor aguda atravessa o meu ego como uma espada. Sem perceber porquê, um impulso arrebata-me e abro os olhos. A tábua estava mesmo em frente aos meus olhos, agora nítida e impetuosa, no seu odor maquiavélico a pinheiro queimado:

"Poder, o fruto mais apetecido. Prepotência, um dos seus maiores caroços."

Amarrado a uma cadeira no chão e cheirando o pó que calma e arrogantemente invade as minhas narinas, fecho os olhos e só desejo que quem aqui me colocou se engasgue em breve.